O corpo como um interventor urbano é coisa de artista. Andar na contramão de uma procissão, vestir-se de um jeito mais deslocado da normatividade, entre outras ações, geram novas configurações que são efêmeras. Por vezes, nosso único contato visual é a fotografia ou vídeo, os chamados registros.

Essa arte do corpo e da rua flertam muitas vezes com um limiar entre as artes visuais e as artes cênicas. Na arte brasileira, a história da performance surge na rua com as ações de Flávio de Carvalho (1899-1973).

Luiz Camillo Osorio aponta que Flávio de Carvalho fazia experimentos artísticos e ficou isolado, pois tinha como proposta uma antiarte, algo que só se viu na cultura brasileira após 1960. Desta forma, o artista buscava analisar tanto o sujeito, quanto a realidade, compreendendo que a subjetividade era algo inventado, imaginado e não pleno de autonomia.

Duas ações mostram um pouco o pensamento de Flávio de Carvallho. Na década de 1930, fez um experimento que mostra a dimensão do social que queria atingir: no meio de uma procissão de Corpus Christi no centro de São Paulo, usando um chapéu, foi contra o fluxo de fiéis, causando indignação no público, sendo quase linchado. Uma das justificativas registradas é que Flávio considerou tal ação como uma investigação psicológica das massas.

Experiência nº 3 – São Paulo, 1956. Imagem arquivo.

Flávio de Carvalho foi pioneiro em performance. Na rua, travestia-se com roupas não-convencionais para a época e situações. Na foto (acima), Flavio, em 18 de outubro de 1956, aparece numa passeata-desfile, em São Paulo. Como ele afirmaria: “A moda pertence ao domínio da fantasia, portanto da grande criação do espírito humano”, como diria o próprio artista no livro “Espaço da Arte Brasileira – Flávio de Carvalho”.

A rua como destino

Outra célebre artista que procurou a rua para expor suas ideias, foi Lygia Pape (1927-2004). a artista carioca transitou por vários caminhos no universo da arte. Criou pinturas geométricas, desenhos, relevos, xilogravuras, instalações, poemas e performances.

Obra Divisor, 1968. Lygia Pape. Imagem Arquivo.

Foi exatamente com o corpo que Lygia Pape descobriu o espaço urbano. Em 1967, ao se dedicar a pesquisar arte e ambiente, Pape elabora uma ação coletiva que deveria ser realizada em um espaço privado. O nome da proposição era Divisor. A obra consistia em um tecido tensionado branco com fendas. Ao fruidor caberia colocar a cabeça em uma das fendas. Esta era a obra.

Desta forma, Flavio de Carvalho e Lygia Pape marcam o espaço urbano com sua arte. Um como autor-criador-participante. A outra como autora-criadora-propositora. Corpo e espaço urbano unidos para a fruição.

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